Lula se irrita com “Bet da Caixa” e ordena revisão do projeto de apostas do banco estatal
Plataforma de apostas da Caixa contraria discurso do governo sobre justiça tributária e acende alerta no Planalto
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se irritou com o anúncio de que a Caixa Econômica Federal pretende lançar sua própria plataforma de apostas esportivas, a Bet da Caixa. A decisão do banco, presidido por Carlos Vieira, pegou o governo de surpresa e gerou desconforto entre auxiliares próximos ao presidente. Lula pretende convocar Vieira para uma reunião assim que retornar da viagem à Ásia, com o objetivo de convencê-lo a suspender o lançamento.
Aliados do presidente avaliam que a iniciativa de um banco público entrar no mercado de apostas vai na contramão do discurso que o governo vem defendendo sobre justiça tributária e regulação das bets. Para o entorno de Lula, o projeto enfraquece a narrativa política construída em torno da taxação de “bilionários, bancos e bets” — slogan usado pelo PT para defender o aumento de impostos sobre grandes fortunas e setores considerados especulativos.
A criação da Bet da Caixa foi aprovada pela Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda, mas o parecer técnico limitou-se à análise formal, sem considerar o impacto político da decisão. O problema é que o presidente da Caixa, embora funcionário de carreira, foi indicado pelo PP, partido ligado a Arthur Lira (AL) e Ciro Nogueira (PI) dois defensores da legalização das apostas no Congresso.
Por isso, interlocutores do Planalto admitem que barrar a Bet da Caixa pode gerar atrito com o Centrão, mas consideram que o custo político de permitir o lançamento seria ainda maior. “Lula vai mandar cancelar”, disse um auxiliar presidencial à colunista Carla Araújo, do UOL Notícias.
A operação da Bet da Caixa estava prevista para ser lançada em 26 de novembro, com três marcas registradas: BetCaixa, MegaBet e Xbet Caixa. A expectativa do banco era arrecadar até R$ 2,5 bilhões em 2026.
Entretanto, suspender o projeto pode ter um alto preço. A Caixa firmou contrato com a empresa Playtech – VS Technolog, responsável pela plataforma digital integrada de apostas, em modelo “turnkey” e “omnichannel”. Segundo fontes do setor, romper o contrato acarretaria multa milionária, equivalente ao valor total da operação de cinco anos o que significaria prejuízo direto aos cofres públicos.
Enquanto isso, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, prepara o envio de novos projetos de lei ao Congresso para recompor as perdas da MP 1303, derrubada pelos parlamentares. As propostas devem focar em controle de gastos públicos e na taxação de bets e fintechs, embora o escopo sobre o setor financeiro tenha sido reduzido.
Segundo integrantes do governo, a ênfase agora recai sobre as apostas online e os chamados “jogos do tigrinho”. Haddad afirmou que Lula quer que o Congresso trate o tema como prioridade: “Nossa avaliação é que as bets estão trazendo muitos danos à saúde pública”, declarou o ministro.
Pesquisas internas do Planalto reforçam a posição do governo: a maioria da população vê com desconfiança o avanço das apostas esportivas, associando o vício em jogos a problemas de saúde e endividamento. O aumento recente da popularidade de Lula, segundo levantamentos, estaria ligado justamente à defesa de políticas de taxação sobre setores considerados nocivos.
O episódio expõe uma contradição dentro do próprio governo: enquanto o Ministério da Fazenda tenta endurecer a taxação das apostas para reforçar o discurso de justiça social, um banco público se prepara para lucrar com o mesmo mercado. Resta saber se Lula conseguirá conter a ofensiva da Caixa e se, no embate entre discurso político e interesse econômico, a coerência valerá mais que os bilhões prometidos pela Bet da Caixa.



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