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Congresso avalia dobrar imposto das “bets” e juristas alertam para risco de inconstitucionalidade e colapso do novo mercado regulado

Tramitam no Congresso Nacional dois Projetos de Lei – 5.076/2025 e 5.473/2025 – que propõem elevar de 12% para 24% a alíquota sobre o GGR das apostas de quota fixa. A medida pode levar a carga tributária total do setor a cerca de 72,25%. Um parecer da advogada Yasmin Farias aponta possíveis vícios de inconstitucionalidade, falta de base técnica e risco direto à sustentabilidade do mercado recém-regulamentado no Brasil.

O Congresso Nacional analisa duas propostas que podem alterar de forma significativa a tributação das apostas de quota fixa no Brasil, as chamadas “bets”. Os Projetos de Lei 5.076/2025 e 5.473/2025 sugerem a elevação da atual alíquota de 12%, definida pela Lei Federal nº 14.790/2023, para 24% sobre o GGR (Gross Gaming Revenue). Caso aprovadas, as mudanças podem elevar a carga tributária total do setor para aproximadamente 72,25%, segundo análises técnicas citadas no parecer jurídico.

A autora do estudo, a advogada Yasmin Farias, elaborou uma análise jurídica e econômico-regulatória sobre o tema, avaliando os impactos das propostas no mercado e na estrutura concorrencial do setor. O documento destaca que o segmento de apostas de quota fixa iniciou suas operações reguladas oficialmente em 1º de janeiro de 2025, estando, portanto, em fase inicial de consolidação.

A justificativa dos parlamentares que propõem a majoração da alíquota se baseia no argumento de que as apostas representam uma atividade de “risco social” e que o aumento teria caráter extrafiscal, com o objetivo de desestimular o consumo e direcionar recursos adicionais para políticas públicas de saúde. No entanto, o parecer aponta que, mesmo em casos de extrafiscalidade, a tributação deve respeitar limites constitucionais claros.

O documento faz referência direta ao princípio da capacidade contributiva, previsto no artigo 145, §1º, da Constituição Federal, segundo o qual os impostos devem ser graduados de acordo com a capacidade econômica do contribuinte. Segundo a análise, o setor de apostas já é submetido a uma estrutura tributária complexa e pesada, que impacta de forma direta o patrimônio e a viabilidade das empresas operadoras.

Além da alíquota de 12% sobre o GGR, as empresas do setor estão sujeitas a uma taxa de fiscalização que varia de R$ 54.419,56 até R$ 1.944.000,00, conforme a faixa de receita. Também incidem tributos federais sobre o lucro, como o IRPJ, com alíquota de 25%, e a CSLL, de 9%. Soma-se a isso o PIS e a COFINS, que totalizam 9,25% sobre a receita bruta, além do ISS, que pode variar entre 2% e 5%, a depender do município.

De acordo com levantamentos técnicos mencionados no parecer, a carga tributária potencial do setor já pode alcançar cerca de 60%, sem considerar custos operacionais essenciais. Esse cenário, segundo a advogada, torna ainda mais preocupante qualquer tentativa de majoração abrupta, especialmente em um mercado que ainda busca estabilidade e amadurecimento regulatório.

Outro ponto sensível levantado é a ausência de estudos técnicos que comprovem que o aumento da alíquota resultaria, de fato, na redução da ludopatia ou em uma ampliação sustentável da arrecadação. A falta de uma análise de impacto econômico fragiliza a justificativa das propostas e compromete seu fundamento constitucional.

O parecer cita entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre os limites do poder de tributar, incluindo manifestação do ministro Celso de Mello, que reforça a necessidade de respeito à razoabilidade e à proporcionalidade das normas tributárias, sob pena de violação ao devido processo legal substantivo.

Dados de estudo contratado pelo Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR) e pela Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL) indicam que o setor de apostas deve gerar mais de R$ 9 bilhões em arrecadação em 2025, além de investimentos já declarados de cerca de R$ 7,5 bilhões no país. Estima-se também um potencial de até R$ 28 bilhões em demanda adicional para outros setores da economia e a geração de milhares de empregos diretos e indiretos.

Diante desse cenário, Yasmin Farias conclui que os projetos apresentam vícios materiais de inconstitucionalidade, ao violarem princípios como o da capacidade contributiva, da isonomia tributária, da livre concorrência e da livre iniciativa, além de apresentarem risco de caráter confiscatório.

Com um mercado recém-estruturado, bilhões já investidos e milhares de empregos em jogo, a tentativa de dobrar a carga sobre as bets levanta uma pergunta inevitável: o Estado está regulando para organizar o setor ou para inviabilizá-lo? O futuro das apostas legais no Brasil pode estar sendo decidido agora e a sociedade não pode ficar de fora dessa discussão.

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