STF manda suspender todas as loterias municipais no Brasil e impõe multas pesadas a gestores e empresas
O Supremo Tribunal Federal determinou a suspensão imediata de todas as loterias municipais em operação no país. A decisão cautelar, tomada pelo ministro Nunes Marques na ADPF 1.212, proíbe os municípios de manterem ou criarem qualquer serviço de apostas, inclusive esportivas e jogos online. O descumprimento da ordem pode gerar multas de até R$ 500 mil por dia.
Em decisão proferida nesta quarta-feira, o ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal, determinou a suspensão imediata de todas as loterias municipais em funcionamento no Brasil. A medida foi tomada no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1.212 e atinge dezenas de municípios que haviam criado sistemas próprios de apostas, incluindo modalidades de quota fixa, como apostas esportivas e plataformas de jogos online.
A decisão cautelar suspende a eficácia de todos os atos normativos municipais que autorizaram ou regulamentaram a criação e a exploração de loterias. Além disso, o ministro ordenou o encerramento das operações já em andamento e proibiu a prática de qualquer novo ato relacionado a essas atividades no âmbito municipal.
O entendimento do STF está amparado na Lei 14.790, de dezembro de 2023, que alterou a Lei 13.756/2018 e concentrou no Ministério da Fazenda as atribuições para regulamentar e credenciar as empresas autorizadas a operar apostas. Com a inclusão do artigo 35-A na legislação, a exploração das loterias passou a ter tratamento normativo específico para os Estados e o Distrito Federal, deixando os municípios de fora dessa competência.
Na decisão, Nunes Marques ressaltou que os serviços lotéricos possuem caráter nacional sob o ponto de vista legislativo, e nacional e regional na esfera administrativa. Segundo ele, essa atividade exige alto grau de cautela por parte do poder público e uma estrutura regulatória centralizada, justamente para garantir controle, fiscalização e proteção aos usuários.
O Supremo já havia se manifestado sobre os riscos envolvendo as loterias, especialmente as apostas de quota fixa, durante o julgamento das ADIs 7.721 e 7.723, de relatoria do ministro Luiz Fux, publicado em novembro de 2024. Na ocasião, o Plenário apontou falhas na proteção ao consumidor e um déficit de regulamentação capaz de conter os impactos negativos desse tipo de atividade.
Para Nunes Marques, permitir que municípios operem casas de apostas sem supervisão do Ministério da Fazenda cria uma distorção perigosa: uma atividade que é proibida no plano federal acaba sendo, na prática, autorizada em nível local, em mais de 5 mil municípios. Essa fragmentação, segundo ele, enfraquece a fiscalização nacional e facilita a flexibilização de regras com o objetivo de aumentar arrecadação e atrair investimentos.
O ministro citou leis municipais de cidades como Guarulhos, São Vicente, Belo Horizonte, São Paulo e Campinas como exemplos de normas que acabaram inovando em relação à legislação federal, especialmente no que diz respeito ao repasse dos valores arrecadados. Esse tipo de iniciativa, de acordo com a decisão, compromete o equilíbrio federativo e cria insegurança jurídica.
Outro ponto de destaque é que casas de apostas que não cumprem os critérios estabelecidos pelo Poder Executivo Federal não podem, em hipótese alguma, operar serviços lotéricos em âmbito municipal. O ministro afirmou que qualquer entendimento diferente fere os princípios da ordem econômica previstos no artigo 170 da Constituição.
Segundo os dados citados na ação, somente em 2025, após o ajuizamento da ADPF, cerca de 55 municípios, em 17 estados de todas as regiões do país, criaram suas próprias loterias. Nos últimos três anos, mais de 80 municípios editaram normas nesse sentido. A decisão lista 70 cidades que instituíram sistemas lotéricos, incluindo Belém, Betim, Foz do Iguaçu, Juiz de Fora, São Gonçalo, Sorocaba e Teresópolis.
Diante desse cenário, o ministro considerou a intervenção do STF urgente para impedir a expansão do que classificou como um quadro crescente de inconstitucionalidade. Como forma de garantir o cumprimento da decisão, foram fixadas multas diárias de R$ 500 mil para os municípios e empresas que insistirem na operação dos serviços, e de R$ 50 mil para prefeitos e dirigentes que continuarem ligados à exploração dessas atividades.
A medida também está alinhada com outra decisão cautelar concedida em janeiro de 2025 pelo ministro André Mendonça, na Ação Cível Originária 3.696, posteriormente referendada pelo Plenário em março do mesmo ano.
Nunes Marques ainda determinou a intimação da Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda, da Anatel e da Associação Nacional de Jogos e Loterias para a adoção das providências necessárias. Essas instituições já possuem acordos de cooperação técnica em vigor para otimizar o bloqueio de sites ilegais e aprimorar a detecção e o combate à oferta irregular de apostas no país.
A decisão do ministro será submetida ao referendo do Plenário do STF em sessão extraordinária do Plenário Virtual, que deverá ser convocada pela Presidência da Corte.
Com a ofensiva do Supremo contra as loterias municipais, o recado é claro: a era das apostas locais sem controle pode estar chegando ao fim. Mas será que todos os municípios vão cumprir a decisão ou esse embate entre arrecadação e legalidade ainda vai render novos capítulos? O debate está aberto e promete esquentar ainda mais.



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